Para os clubes: antes de pensar em receber, pense em dar

24 de Setembro, 2020 - 3 mins de leitura

Por que razão um jogador virá para o nosso clube e não para outro? Por que razão uma empresa decidirá apoiar-nos e não a outros? O que leva os pais a pagar-nos para ficar com os filhos e não se decidirem por outro clube a 10 ou 15 quilómetros de distância?

Para-se para pensar um bocadinho sobre isto e a conclusão faz sentido: o futebol é uma atividade de troca de serviços, feito de relações e acordos bilaterais, em que ninguém dá alguma coisa em troca de nada. E é justo que assim seja. Um clube quer resultados de um treinador, mas o treinador espera que o clube lhe dê as melhores condições; um treinador espera o máximo dos jogadores, mas os jogadores esperam que o treinador os ajude a evoluir e a crescer; um clube quer a ajuda de uma empresa, mas a empresa quer tirar proveito disso; os adeptos fazem-se sócios, pagam bilhetes ou, simplesmente, sentam-se em frente à televisão e querem bons jogos, boas exibições e bons resultados. Não só é justo, como faz sentido.

Esta situação não é nova, mas acentuou-se incrivelmente nos últimos anos, com o aumento do mediatismo, do escrutínio, do dinheiro, da oferta, da cobertura televisiva, com a presença das redes sociais, etc. E continuará a aumentar, se se tiver em conta que a competição e a concorrência, sob todos os pontos de vista, será cada vez mais feroz.

Os clubes de futebol nunca tiveram tanta concorrência como agora, inclusivamente uns dos outros. Não é o problema de haver muitos clubes, que os há efetivamente; a questão é que há muitos clubes que agora estão à disposição de muita mais gente, em diferentes países, continentes até. Hoje é fácil ver jogos de todo o Mundo, é fácil ir jogar para o estrangeiro, é simples colocar um logotipo ou um patrocínio numa camisola, esteja ela a 10, a 10, a 1000 ou a 10 000 quilómetros de distância.

Há muitos jogadores, há muitos clubes, há muitos jogos, há muitos campeonatos, logo há muito por onde se escolher. Para todos. E isto é válido quando o assunto é contratar jogadores (como é que os convencemos a jogar por nós?), mas também é válido, importante e, acredito, decisivo, quando se quer convencer os pais de que o nosso clube é o ideal para os filhos ou quando se procura convencer uma empresa a investir em nós.

Devemos querer que invistam em nós. E isso muda tudo. Já não é de ajudar que se trata (as empresas também querem retorno, lembra-se?), mas de estabelecer parcerias e de atrair parceiros e investidores para o nosso lado, graças à nossa ideia, à nossa visão, à nossa causa, aos nossos valores.

O dinheiro continua e será sempre importante, mas é possível combatê-lo e diminuir o peso que tem. É uma obrigação quase, mesmo para os que têm muitos milhões à disposição.

E o primeiro passo para isso é ter-se a noção de que no futebol, como em tantas outras atividades (em todas?), tem que se dar para receber e não pensar apenas em receber. Ter uma ideia de jogo, alimentar uma política desportiva atrativa, estar associado a uma causa, defender determinados valores é, por isso mesmo, cada vez mais importante. É fazer sentir aos que queremos que nos ajudem que não queremos que o façam porque sim e porque precisamos, mas porque podem fazer parte de algo diferente, especial, poderoso, com visibilidade, reconhecimento, e capacidade para devolver a confiança e a escolha em nós na mesma medida.

Acredito que o caminho para se ser bem sucedido neste futebol cada vez mais competitivo, onde se luta quase desesperadamente por cada jogador, por cada ponto, por cada milhão e por cada espaço mediático, passa por pensar primeiro em dar (o quê, como e para quem pode variar de caso para caso), para depois receber. Em vez de se correr sempre atrás de apoio, de dinheiro, de patrocínios e de jogadores, pense-se em como se pode atraí-los. O que é que temos de diferente dos outros? O que é que eles ganham ao juntarem-se a nós?

“Defende uma CAUSA, cria VALORES que te identifiquem claramente e alimenta uma CULTURA. É assim que estás mais perto de atrair atenção, garantir fidelidade e apoios, independentemente dos resultados. Em vez de seres tu a ir atrás deles, serão eles a querer associar-se a ti”.

Vasco Samouco