Pedro Henriques tornou-se dirigente do Bahia aos 29 anos e durante quatro épocas, primeiro como vice-presidente e depois como diretor-executivo, ajudou a reerguer o clube de uma falência que era desportiva e financeira. É um dos dirigentes mais respeitados do futebol brasileiro, tendo sido eleito o melhor CEO em 2019. Nesta entrevista, a segunda disponível no canal do YouTube depois de Jorge Araújo, explica o processo que tirou o Bahia da crise e como isso pode ajudar outros clubes, e como ser competente e profissional fora do campo é essencial para conseguir bons resultados desportivos. Os desafios e os erros a evitar na gestão, a necessidade de alimentar uma cultura e uma mentalidade de crescimento constante, ter uma visão que oriente todas as decisões tomadas, a importância de pensar no médio e no longo-prazo e o futuro que espera o futebol são outros dos temas abordados.
A entrevista completa está disponível NESTE LINK.
Em baixo, deixo-lhe algumas das passagens mais interessantes da conversa:
A RECUPERAÇÃO DO BAHIA
”Faltava transparência. Os sócios não entendiam o funcionamento do clube e começamos esse processo de democratização, de profissionalização e de gestão profissional”.
“No Brasil, os mandatos são muito curtos. Então, o que fizemos foi estabelecer metas mais práticas, de curto e de médio-prazo, que, se consolidadas e reiteradas ao longo do tempo, poderiam fazer com que o clube atingisse esses objetivos de longo-prazo”.
“O planeamento que fizemos privilegiava atletas oriundos da formação, uma reformulação completa da estrutura organizacional do clube, com cargos e salários condizentes dentro da organização, porque um clube de futebol não é só futebol. Tem marketing, tem administração, tem património… Quando pensámos o plano, desenvolvemos um organigrama muito funcional e o Bahia passou a ter apenas três diretores. Contratámos profissionais para o marketing, para o futebol e para a área financeira, e esse era o núcleo duro para tomar decisões”.
ERROS DOS DIRIGENTES
”O básico no futebol é você só se comprometer a fazer o que você tem capacidade para fazer, só que muitas pessoas não têm esse entendimento. Os dirigentes estão mais preocupados em fazer nome, em ganhar e assim endividam o clube”.
”São várias decisões, no dia-a-dia, que vão revelar que tipo de dirigente está à frente do clube, se está preocupado em tomar as medidas mais adequados para tornar o clube forte no médio e no longo-prazo ou se ele quer apenas ter conquistas para deixar um legado como se ele fosse um grande vencedor”.
“Há uma linha muito ténue entre a convicção no desenvolvimento de um trabalho e a teimosia. Não se pode achar que se é o dono da verdade. O dirigente inteligente é o que aprende com os seus erros e o mais inteligente é o que aprende com os erros dos outros”.
GESTÃO DE CLUBES
“O próprio Bahia ainda paga inúmeras dúvidas a ex-funcionários de clube que recorreram à Justiça. Se o Bahia pudesse usar o que paga de dívidas antigas para o futebol podia ter mais uns quatro jogadores de altíssimo nível. Isso mostra que a gestão irresponsável torna a equipa mais fraca, é indiscutível“.
“Não se pode ser estritamente cartesiano e pensar unicamente no aspeto financeiro e administrativo, mas você tem que ser o máximo responsável possível. É preciso ser ousado, saber arriscar, mas os riscos devem ser calculados“.
“Um dos melhores livros do futebol é ‘A Bola não entra por acaso’, mas eu discordo: a bola entra bastante por acaso. Cabe a nós, dirigentes, fazer com que todas as decisões tenham fundamento para conseguir o crescimento pretendido“.
”Saber qual é o DNA do clube, qual o modelo de jogo que se quer implementar, é essencial para não tomar decisões erradas logo no início. Não posso querer um estilo de jogo proativo e contratar um treinador reativo”
A IMPORTÂNCIA DE TER UMA VISÃO E ALIMENTAR UMA CULTURA
“O incómodo puro no futebol gera resignação, mas você tem que se incomodar e agir. A autocrítica sozinha não leva a lado nenhum, ela tem que vir acompanhada de ações para fazer os reparos e esses reparos vêm com ambição aliada à responsabilidade”.
“O Athletico Paranaense é o clube referência para mim porque começou esse processo de profissionalização desde a década de 1990: não era sequer o melhor clube do seu Estado e hoje é indiscutivelmente o melhor. É um exemplo de desenvolvimento de trabalho a médio e a longo-prazo e tem outra coisa interessante: há 20 anos colocou a meta de ser campeão do Mundo em 2024 e todos os funcionários sabem isso porque é repetido constantemente. Isso entra na mentalidade e a mentalidade não pode ter acomodação, é o principal para se mudar a cultura“.
“Para planear é muito importante saber qual é a missão, a visão e os valores do clube para assim se ter os pilares fundamentais da gestão desportiva, de maneira a que cada ação e decisão se reflita nessa visão. E no futebol isso quase não existe”
”Não adianta ter o melhor planeamento e ter as melhores políticas se no dia-a-dia não se implementar a cultura que se quer. É essencial ter uma linha de trabalho que gera sempre inconformismo”.