O Brentford e o Midtyjlland não têm sucesso por causa do uso massivo da ‘big data’; o Lille não é um clube exemplar devido à rede de scouting tão brilhantemente organizada e aproveitada; o Manchester City não ganha por ter muito dinheiro, assim como o Barcelona não viveu o seu período mais vitorioso e construiu uma das melhores equipas de sempre por apostar na ‘cantera’; ou o Ajax faz a diferença pelo trabalho feito nos escalões de formação. Ou, dito de outra forma, não é só por cada uma destas razões que estes clubes têm ou tiveram êxito.
Os bons resultados nunca são consequência de uma só coisa, tal como os maus resultados dificilmente têm uma só causa.
Sempre que posso, revejo o ‘Moneyball’. Por esta altura, até porque o termo já está bem enraizado no futebol, todos sabemos do que se trata. É um filme inspirador. Mas o interessante é que aquilo que foi feito e é visto como algo para salientar uma mudança de paradigma no desporto (no caso, o beisebol) devido ao uso das estatísticas para recrutar e construir uma equipa boa com atletas subvalorizados, acaba por ser mais do que isso.
Confiando no filme (não li o livro) como espelho da realidade, a aposta de Billy Beane (representado por Brad Pitt) começa a correr mal. Os Oakland Athletics perdem praticamente todos os jogos no início dessa época e é só quando o diretor-geral da equipa assume posições de liderança eficaz (vai ao balneário depois de uma derrota, ouve música e dá um sermão aos jogadores: “o som da derrota é o silêncio”) e toma decisões fortes ao nível de gestão (manda atletas embora para o treinador fazer o que ele quer ou prescinde de atletas potencialmente bons, mas que não têm rendimento) que os Oakland Athletics começaram a ganhar jogos, acabando a fazer história nessa época (recorde de vitórias), com a Billy Beane a tornar-se alguém importante no mundo desportivo.
Ou seja, a aposta na ‘big data’ foi, de facto, diferenciadora, disruptora e influenciadora, mas o que fez a diferença neste caso concreto foi o facto de essa aposta estar acompanhada de outras decisões, outros comportamentos e outras ações que se revelaram decisivas para o sucesso do projeto e da ideia.
O mesmo é válido nos casos mencionados acima. O Brentford usa e abusa da análise de dados, mas também aposta muito em treinadores e em especialistas relacionados com mindset, alimentação, etc, enquanto o Midtyjlland concilia a ‘big data’ com um trabalho notável na formação de futebolistas e em competências humanas para as mais diversas áreas. O Lille tem uma rede de scouting incrível, claro, mas isso é apenas uma parte de um projeto e de uma ideia de gestão e de evolução mais completa. O Manchester City tem dinheiro, óbvio, mas usa-o para alimentar uma ideia e uma visão de médio e de longo-prazo e percebeu que precisava de um grande treinador para potenciar os grandes jogadores que compra. O Ajax é dos clubes que melhor trabalha ao nível formativo, mas depois aproveita esses jogadores, dá-lhes espaço na equipa principal, ganha com eles e depois vende de maneira a abrir espaço para a próxima fornada.
Explicar vitórias e derrotas é mais complexo do que pode parecer e simplificá-las pode ter consequências negativas e pouco produtivas. Não é por se apostar na ‘big data’ que, de repente, um clube será tão bem sucedido como o Midtyjlland, nem por se apostar na formação que todos podes ser o Ajax ou o Barcelona de Pep Guardiola; nem uma estratégia de scouting brilhante fará de todos os clubes um Lille. É preciso mais do que isso para se aspirar ao sucesso contínuo e consistente.
Tal como um bom treinador não tem apenas uma qualidade e as boas equipas não se destacam numa só vertente do jogo, também é um erro presumir que um clube tem sucesso por causa de uma estratégia específica ou porque se destaca em alguma coisa. Não, os clubes que têm sucesso consistentemente fazem muitas coisas bem, exploram vários aspetos e unem todas as forças que conseguem, aos mais variados níveis.
Os milagres acontecem lá de longe a longe e isso pode levar a pensar o contrário, mas não há fórmulas milagrosas para se ter bons resultados de forma contínua. O que há são projetos idealizados e alimentados a vários níveis, que têm, realmente, algo que os diferencia e lhes dá um mediatismo maior, mas que inserem essa mais-valia num todo mais profundo e abrangente, menos óbvio e, acima de tudo, pensado holisticamente. Os bons resultados têm várias causas.