Jordan Gardner é um investidor e gestor americano de futebol, para além de empreendedor empresarial. Tem investimentos no Dundalk FC (República da Irlanda) e no Swansea City (Inglaterra), é o acionista maioritário e o presidente do FC Helsingor (Dinamarca), desde março de 2019, e esteve entre os finalistas para o prémio de ‘Best Executive’ atribuído pela World Football Summit em 2020.
Nesta entrevista, feita via e-mail (e ajustada para maior fluidez e melhor compreensão), ele partilha ideias e princípios que orientam as suas decisões, quer a nível de investimentos quer a nível de gestão (desportiva e financeira), identifica alguns dos erros mais graves que os clubes cometem e aponta caminhos e estratégias a seguir para tornar os clubes sustentáveis e melhor preparados para terem sucesso.
Sobre o futebol português, Jordan Gardner defende que a “não centralização dos direitos televisivos afasta potenciais investidores”: “Assim é muito difícil criar um modelo financeiro que funcione”.
Por que razão o futebol e os clubes de futebol são bons investimentos?
Há várias razões, mas diria que as principais estão relacionadas com a possibilidade de vender futebolistas e ter lucros com isso, promover clubes de divisões baixas até às divisões mais altas e isso adicionar mais receita operacional e aumentar as avaliações de franquia. Por outro lado, também é possível capturar grandes receitas em direitos televisivos em várias ligas.
É investidor no Swansea City e no Dundalk FC, para além de acionista maioritário e presidente do FC Helsingor. Como escolhe os clubes nos quais investir? Qual é o processo?
Todos os meus investimentos são muito estratégicos e muitas vezes resultado de conhecimentos pessoais que eu tenho na indústria do futebol. No caso da Dinamarca, por exemplo, o que me levou a escolher o FC Helsingor foi o facto de ter uma localização próxima com uma grande cidade europeia (Copenhaga), de ter excelentes infra-estruturas (estádio novo) e por causa do foco na formação e no desenvolvimento de jovens jogadores. Nunca analiso só o clube de uma forma muito específica, analiso vários fatores. Depois decido qual o clube em que faz mais sentido investir.
O futebol nunca teve e nunca movimentou tanto dinheiro como agora. No entanto, a maioria dos clubes debate-se com problemas financeiros e muitos fecham portas. Como explica isto?
Considero que muitos clubes são mal geridos e administrados, e gastam dinheiro demais, o que os coloca em problemas financeiros. Mesmo um clube como o Barcelona, um dos maiores do Mundo, está em grandes dificuldades. Penso que muitos clubes ainda não são tratados como empresas, logo as decisões muitas vezes não são sensatas. Gastam muito dinheiro em salários e não têm disciplina financeira quando se trata de gastar e investir em outras áreas.
Escreveu um artigo sobre “Como clubes mais pequenos estão a conseguir resultados acima das expectativas”. Quais são os principais segredos?
Dois aspetos em concreto parecem-me decisivos: os clubes inteligentes usam ‘data’ (dados estatísticos/numéricos/quantificáveis) para se tornarem mais inteligentes e mais eficientes na tomada de decisão. Por outro lado, contratar bem, ter boas pessoas (treinadores, diretores desportivos e staff), pode fazer uma grande diferença entre sucesso e fracasso.
Quase todos os clubes de futebol são de pequena dimensão. Mas isso não tem que ser necessariamente mau. Que vantagens têm os clubes pequenos em relação aos grandes?
Os clubes mais pequenos são mais versáteis, mais ágeis, e às vezes podem tomar decisões mais rápido do que os clubes grandes. Além disso, os clubes pequenos têm a oportunidade e o contexto ideal para testar novas tecnologias e de experimentar coisas de uma maneira que os grandes talvez não consigam (devido à maior pressão).
É presidente do FC Helsingor desde março de 2019. O que é que mudou no clube neste período? Quais são os planos para o futuro?
Mudámos completamente a cultura e tudo o resto no clube, de cima a baixo. Também tivemos a sorte de as nossas mudanças terem resultado num sucesso muito rápido, visto que fomos promovidos (à 2.ª Divisão dinamarquesa) na época passada, e este ano está a ser muito bom até agora. Para o futuro queremos outra promoção para a SuperLiga dinamarquesa e vender alguns dos nossos melhores jogadores jovens para clubes maiores.
O presidente também tem que ser um líder. Neste sentido, que qualidades deve ter um presidente, de um ponto de vista individual, mas também de uma perspetiva organizacional?
Liderança tem a ver com construção de uma cultura e conseguir que todas as pessoas envolvidas na organização queriam vir trabalhar diariamente e que desfrutem do que fazem. É importante que toda a organização, tanto dentro como fora do campo, tenha uma cultura positiva.
Em Portugal temos tido muitas más experiências com investidores. Eles vêm, mas não pagam salários, deixam dívidas e vão embora. Como pode convencer os adeptos de que ter um ou mais investidores é bom para os clubes?
No final de contas, os clubes de futebol são empresas, são negócios, logo precisam de apoio financeiro e de conhecimento para terem sucesso. Acredito que mais investidores estrangeiros chegarão a países como Portugal e tomarão boas decisões, mas claro que existirão sempre más abordagens e é pena que esses não levem a sério a responsabilidade de deter um clube de futebol.
Está a pensar investir em Portugal?
Nesta altura, não. O facto de os direitos televisivo não serem centralizados torna muito difícil criar um modelo financeiro que funcione.
O Jordan também é um empreendedor empresarial. No que é que essa experiência o ajudou sobre investir no futebol e gerir clubes?
Gerir um clube de futebol não é diferente de gerir uma pequena empresa ou uma startup, aplicam-se as mesmas regras a uns e a outros. Ter essa experiência no “mundo real” foi muito benéfico para mim porque essas ferramentas são perfeitamente traduzidas no mundo do futebol.
Como perspetiva o futebol daqui a cinco anos? Quais serão as grandes mudanças na indústria como um todo e na gestão dos clubes?
Nesta altura, todos estamos em modo de sobrevivência por causa da Covid-19 e espero que daqui a cinco anos as coisas tenham voltado ao normal (pré-Covid). Quanto a mudanças, espero que os clubes tenham aprendido a lição de que a disciplina financeira é vital para ter sucesso: não subestimem esse aspecto.