Este sábado, o Eintracht Frankfurt, a lutar por um lugar na próxima edição da Liga dos Campeões, defronta o Borussia Monchengladbach, que não pode perder sob pena de deixar fugir um lugar que lhe garanta a presença nas competições europeias de 2021/22. Este também será um duelo entre a atual e a futura equipa do treinador Adi Hutter, o treinador cuja transferência foi confirmada no início desta semana e que se segue ao anúncio da saída de Marco Rose do comando técnico do Monchengladbach para o Dortmund.
No entanto, o que em tantos outros países e campeonatos, Portugal incluído, seria motivo de desconfianças e atentados ao profissionalismo, na Alemanha começa a ser normal. O Bayern Munique também e já confirmou que vai contratar Upamecano ao RB Leipzig, o rival direto na luta pelo título; em junho de 2018, RB Leipzig e Hoffenheim comunicaram a mudança de Julian Nagelsmann com um ano de antecedência; em janeiro de 2014 foi anunciado que Lewandowski deixaria o Dortmund para rumar ao Bayern no final dessa temporada. Tudo às claras, sem desconfianças nem temores. Tudo por um bem maior e impagável.
A Bundesliga não tem o poder financeiro de outros grandes campeonatos, nem a fama, nem os melhores jogadores. Mas, mesmo assim, tem-se consolidado como uma das melhores ligas do Mundo – fora e dentro do campo, porque uma coisa leva a outra. Sem o dinheiro, a fama e os craques, sustenta-se em qualidades, valores e pormenores que (também) são decisivos para a evolução e para o prestígio da competição, dos dirigentes, dos treinadores e dos jogadores.
Civismo, respeito, profissionalismo, transparência, credibilidade são qualidades cada vez mais desvalorizadas e negligenciadas, que quase se vão tornando obsoletas num mundo, o futebolístico, que engorda em materialismo, onde o dinheiro ganha cada vez mais relevância e a maximização de receitas financeiras está no topo das prioridades. Contudo, é possível criar valor e existir valorização para além dos milhões e o futebol alemão é o exemplo perfeito disso. Mais do que possível, é uma necessidade! Quanto mais não seja para aqueles que não estão no topo dessa cadeia milionária. Porque essas características também trazem retorno económico, visibilidade e admiração.
Ora, no futebol alemão todas essas qualidades são suportadas e alimentadas por atos, por atitudes e por comportamentos reiterados. Não são conceitos abstratos, que, depois, se acabam por perder e esquecer, conforme os resultados são melhores ou piores. Claro que nem sempre tudo é pacífico; claro que há discórdias. Só que, no fim de contas, os tais princípios e valores sobrepõem-se a tudo.
Se há muitas maneiras de mostrar transparência e de alimentar a credibilidade, então anunciar trocas de treinadores e de jogadores entre rivais, que apenas se vão consumar na próxima temporada, a meio da presente época e com objetivos ainda por concretizar está, parece-me, no topo dessa lista. ‘Vejam, o nosso treinador vai sair para outro clube, mas não temos problemas com isso e continuamos a acreditar no profissionalismo dele’. É um sinal poderoso de respeito, de fiabilidade para os clubes e para a competição, ao mesmo tempo que é um grande voto de confiança e uma grande demonstração do valor que se dá aos treinadores e aos jogadores. Quem não quer estar associado a uma competição assim? Quem não ser respeitado desta maneira?
Até porque, não confirmar transferências com a época a decorrer não significa que elas não estejam já alinhavadas e confirmadas. É utópico pensar-se que jogadores e treinadores não negoceiam transferências durante a temporada, que clubes e dirigentes não preparam a temporada seguinte. Logo, é improvável que acordos para compras, vendas ou dispensas não fiquem fechados antecipadamente e com a competição a decorrer. Então, se eles existem, porquê escondê-los e por que não aproveitá-los para valorizar a competição e todos os que fazem parte dela? O que se ganha em mantê-los em segredo? E o que se perde? Nesta balança, parece-me que os ganhos compensam as perdas, que também existem. Não ter medo de mostrar o que está a acontecer nos bastidores transmite confiança e credibilidade; esconder, pelo contrário, só serve para tentar negar algo que todos sabemos que acontece: corrói a transparência e dá azo à desconfiança.
Faz sentido argumentar que estes anúncios podem ter consequências negativas no resto da temporada – o Borussia Monchegladbach sofreu oito derrotas nos nove jogos seguintes à confirmação da ida de Marco Rose para Dortmund. Mas, a dar de barato que a causa desses maus resultados é essa, o problema foi o anúncio em si? Porque, com ou sem confirmação, a transferência acabaria por se consumar e haveria de ser (re)conhecida internamente. Não é, portanto, o anúncio que é relevante.
Apesar de essa discussão também ser pertinente e merecer reflexão, não está em causa as consequências da decisão de comunicar transferências com épocas em andamento (nem há dados concretos que elucidem sobre isso). O importante aqui é o que esses anúncios, ou a ausência deles, podem fazer, ou não, pela liga e por todos os que dela fazem parte. Sendo certo que tudo o que contribui para a transparência e a credibilidade deve ser sempre prioritário em relação ao que fomenta a desconfiança e põe em causa o profissionalismo.