A importância de decidir como perder

30 de Janeiro, 2020 - 3 mins de leitura

E se perdermos, o que é que fica?

Não tenhamos ilusões. Em tudo o que fazemos, estamos condenados à derrota. É mais provável falhar grandes objetivos do que atingi-los (Quantos jogadores e treinadores chegam à elite? Quantos clubes ganham títulos? Quantas empresas alcançam o estatuto multimilionário? E quantas aguentam para além do terceiro ano de existência? Quantos jornais e revistas vendem milhões de exemplares?). E isso, quase sempre, não é só culpa nossa. Acontece porque ganhar, seja no que for, independentemente de metas mais ou menos ambiciosas, também depende de fatores que estão fora do nosso controlo. Depende da sorte, do contexto, de um dia bom ou mau, de conhecer a pessoa certa no momento certo, de um encontro por acaso, de uma conversa inesperada, de relações pessoais, de uma bola no poste… Até o país onde nascemos e crescemos (o livro “Outliers” explica-o bem) pode ser a diferença entre ganhar e perder. Portugal não é o mesmo que o Bangladesh. Os Estados Unidos são muito diferentes da Eritreia. A sorte começa a ser importante logo à nascença.

Então, se não queremos depender da sorte (nunca devemos contar com ela), o que podemos fazer? No que é que nos devemos focar, acima de tudo? Naquilo em que acreditamos. No que fazemos, no nosso esforço, nas nossas ideias, nas nossas motivações, nos nossos princípios. Na maneira como queremos ganhar, no fundo. Se pensarmos bem, em tudo o que nos garante um mínimo de dever cumprido se a derrota provável chegar. Só assim ganharemos sempre, em qualquer circunstância, seja qual for o resultado final. Se for o melhor, então a vitória será total. Se for o pior, a derrota nunca será absoluta. E é isso que nos aproxima do sucesso.

Mantermo-nos fiéis a nós próprios é facilitar-nos a vida. É não duvidar à primeira contrariedade, é tirar força à incerteza, é insistir quando o futuro não parece risonho, é evitar retrocessos no processo e os desvios no caminho que estamos dispostos a fazer, é não deixar que a vitória e o sucesso nos mude e tolde a lucidez, é não desistir na hora da derrota, é não colocar tudo em dúvida sistematicamente. É tudo mais fácil, sob todos os pontos de vista (estratégico, filosófico, financeiro, etc), quando aquilo que queremos, nomeadamente a longo-prazo, está definido desde o primeiro dia. É tudo mais fácil quando sabemos como queremos perder.

Pessoalmente, posso ter muitos objetivos para este site, planos a médio/longo prazo, ambições profissionais depositadas no sucesso deste projeto, mas a garantia de que os vou concretizar não existe. A única certeza é que se não os alcançar, saberei que fiz tudo como quis, sem me desviar das minhas motivações, das minhas convicções, daquilo que sou e daquilo em que acredito. E isso não é um simples consolo, é outra forma de ganhar.

Nada disto, inviabiliza, ainda assim, que ao longo do processo não se ajustem pormenores, não se repensem estratégias ou não se mudem comportamentos. Desde que essas decisões estejam sempre enquadradas com as nossas convicções e com aquilo que pensamos ser o correto. Se for para mudar só por mudar, então promoveremos comportamentos e atitudes que vão contra os nossos princípios, que estarão desfasados do nosso propósito e a mudança não servirá para nada. É que nesses casos, teremos que dizer e fazer coisas que nem a nós nos convence e se fazemos algo que nos afasta de nós próprios não é lógico ficarmos mais longe dos resultados que queremos? Ao sermos fiéis a nós mesmos, faremos sempre mais, daremos sempre mais de nós, vamos esforçar-nos mais, vamos acreditar mais, sonharemos sempre mais, estaremos sempre mais motivados, reagiremos melhor às adversidades. Seremos mais fortes e resistentes.

Saber como queremos perder é, também, estar ciente de que a derrota é uma possibilidade e essa noção tem um efeito libertador porque diminui o medo de perder, esse sentimento castrador de ideias, inibidor de correr riscos, de pensar e fazer diferente. Quem tem menos medo de perder está mais perto de ganhar.

Como queremos perder deve, portanto, estar sempre presente no início de tudo, deve ser sempre um dos princípios orientadores de qualquer projeto (futebolístico, desportivo, empresarial, etc). Deve ser o fio condutor de todas as decisões e opções que se tomam tendo em vista o fim, que é ganhar.

Tudo isto serve para pessoas, para clubes, empresas e organizações de todo o tipo.

É a saber como é que vamos perder que estaremos mais perto de ganhar.

Bem-vindos!


IDEIAS-CHAVE

  • Ter a consciência da derrota diminui o medo de perder
  • Saber como queremos perder aproxima-nos da vitória
  • A possibilidade de derrota mantém-nos fiéis a nós mesmos e quando somos fiéis àquilo em que acreditamos fazemos sempre mais
  • Se só admitirmos a vitória estaremos sempre a duvidar e a mudar
  • Perder à nossa maneira é importante para ficarmos de consciência tranquila
  • Ganhar também depende de fatores que não controlamos

Vasco Samouco